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Em 1993, uma pequena delegação de São Petersburgo viajou para a sede do Grupo Nycomed na Suíça para discutir as possibilidades de investimentos estrangeiros na Rússia. Entre os delegados estava um assessor muito ambicioso, mas pouco conhecido, chamado Vladimir Putin. O resultado da discussão não é claro, mas a Nycomed estabeleceu presença na Rússia no mesmo ano, aumentando-a gradualmente, até que em 2009 finalmente investiu $97 milhões numa fábrica local. Para a Nycomed, o investimento na Rússia resultou num total de vendas de 640 milhões de euros em 2010.

A Rússia percorreu um longo caminho desde 1993. Putin já não precisa de viajar à procura de investimentos – nos dias de hoje, os gigantes mundiais da indústria farmacêutica estão na fila de espera para serem os seus melhores amigos.

O que mudou, então? Após uma década de instabilidade política e económica, o país começou a estabilizar e assistir a um verdadeiro crescimento económico em todos os principais setores, incluindo o da saúde. Hoje, o mercado farmacêutico russo vale mais de $29 mil milhões, sendo um dos maiores mercados do mundo, com uma taxa de crescimento anual de mais de 10% nos últimos anos.

Este crescimento impressionante está a ocorrer apesar de a Rússia ser um dos países com os gastos farmacêuticos mais pequenos per capita, comparável ao da Roménia. O crescimento do mercado farmacêutico tem como base o tamanho da população russa com mais de 143 milhões de pessoas e com o aumento da perceção da importância da saúde e dos rendimentos disponíveis.

Com quase 60% de todos os medicamentos de prescrição a serem pagos diretamente pelos pacientes, este segmento é o maior segmento do mercado farmacêutico na Rússia, avaliado em $17.3 mil milhões em 2012.

No mesmo ano, 76% do total das vendas de produtos farmacêuticos na Rússia consistiram em medicamentos importados. Este facto reflete como os produtos importados ainda são preferidos pelo consumidor, que os perceciona como superiores em termos de segurança e eficácia, em comparação com os produtos de fabricação nacional.

No entanto, em termos de gastos governamentais, Putin está claramente menos inclinado a pagar um preço premium: o segmento de medicamentos hospitalares russo e o segmento de medicamentos reembolsados ​​valiam em 2012 apenas $5 mil milhões e $ 2,5 mil milhões, respetivamente. Está a ser discutido um plano de reembolso de medicamentos mais alargado a partir de 2016, o que irá aumentar a base de pacientes elegíveis, bem como a atratividade do mercado dentro do setor público na Rússia.

O tamanho e o potencial de crescimento do mercado farmacêutico russo oferecem uma previsão altamente favorável para os investidores estrangeiros. Contudo, é um mercado onde os desafios e as oportunidades são difíceis de separar. Talvez como resultado do sucesso da Nycomed, Putin está plenamente consciente da lucratividade do mercado que o seu país representa para os investidores estrangeiros. A questão é se as iniciativas do governo irão aumentar ainda mais as barreiras de entrada para as empresas farmacêuticas internacionais ou promover o acesso a este mercado emergente ao definir os requisitos mínimos de entrada.

Em dezembro de 2008, o Ministério da Indústria e Comércio da Rússia assinou um decreto que permitia a compra de produtos farmacêuticos estrangeiros só se estes fossem oferecidos com um desconto de 15% comparado com os análogos nacionais existentes. Incentivos menos oficiais também existem, onde os fabricantes estrangeiros são encorajados a estabelecer fábricas na Rússia e em troca recebem tratamento preferencial. A produção local emergiu como uma oportunidade para entrar no mercado russo.

Essa noção foi enfatizada em 2010, quando Putin lançou o ambicioso programa  de reformas do mercado farmacêutico russo “Pharma 2020”. O programa delineou uma estratégia radical para desenvolver a indústria farmacêutica do país e diversificar a economia do país por meio da criação de novos postos de trabalho e redução da dependência das importações. Um dos principais objetivos do Pharma 2020 é que até 2020, pelo menos metade de todos os medicamentos, e 90% de todos os medicamentos vitais vendidos na Rússia, sejam fabricados localmente.

Como resultado, em 2011 foi registado um número recorde de candidaturas de empresas estrangeiras que pretendiam estabelecer as suas próprias instalações de fabricação local ou criar parcerias com fabricantes regionais. A Nycomed era vista como a pioneira em conjunto com outras empresas como Solvay/Abbott, que na década dos anos 90 criou uma parceria de sucesso com a empresa local Petrovax. Só em São Petersburgo existem atualmente mais de nove fábricas farmacêuticas, em projeto ou já em construção. A Novartis com o seu compromisso com a Rússia, está a investir $500 milhões numa nova fábrica de medicamentos que irá funcionar a partir de 2014. A GSK e a Pfizer também têm cimentado a sua posição na Rússia com uma joint venture com o fabricante de medicamentos Binnopharm.

O governo russo continua a promover a produção local e, em março de 2013, propôs que os fabricantes estrangeiros de produtos farmacêuticos estivessem excluídos de concursos estatais, se pelo menos duas alternativas de medicamentos de produção nacional estivessem disponíveis no mercado. A mensagem da Rússia é clara – “agir local” já não é uma vantagem para a entrada no mercado, é uma necessidade.

Mais importante ainda, o programa Pharma 2020 conseguiu garantir um fluxo contínuo de conhecimento e experiência para a Rússia. As empresas farmacêuticas russas estão a aprender não só a forma de fabricar medicamentos em conformidade com as normas internacionais, mas também como desenvolver medicamentos inovadores.